Você não sabe o quanto eu caminhei…

Se você for uma pessoa estranha como eu, provavelmente, deve ter lido o título desse post no ritmo da música do Cidade Negra. E nunca um trecho de música resumiu tão bem um evento na vida. Sim, eu participei de uma maratona!!! Não é piada. É sério! Nunca pensei que essa frase fosse sair da minha boca, mas eu participei de uma maratona! E ainda estou surpresa comigo mesma por ter conseguido esse feito.

Em Londres, o Instituto de Pesquisa sobre o Câncer (Cancer Research UK) organiza maratonas para arrecadar fundos que possibilitem pesquisas que podem salvar vidas. São 36 milhas caminhando pelas ruas de Londres, o que dá 42Km. A  Shine Night Walk ocorre durante a noite inteira. A maioria dos que participam da caminhada são familiares de pessoas que sofrem – ou sofreram – com o câncer. Há também os que vencerem essa doença tão devastadora e outros, assim como eu, que são simpatizantes à causa.

Quando meu amigo me perguntou se eu gostaria de participar da caminhada com a irmã dele e o namorado dela eu disse sim na hora. Antes de saber, é claro, quantos Km equivaliam 26 milhas. Eu passei por um processo de pânico e de “por que diabos eu disse sim?”, mas, no fim, eu sabia que era a coisa certa a fazer. Não apenas porque são pessoas importantes para mim e que, infelizmente, perderam a mãe recentemente, mas porque já estive na posição de “pseudo-pesquisadora” do câncer. “Pseudo” porque estava nos primeiros períodos da faculdade, a qual abandonei na reta final, pois descobri que não era pra mim, principalmente depois de entrar na ala hospitalar infantil com crianças em estado terminal. Acho que nunca fui forte o bastante para isso. Além disso, de alguma forma, participar da maratona pareceu algo certo, pela mãe dos meus amigos, pelas crianças da época do meu estágio, pelo filho de uma amiga e por uma pessoa super do bem que tinha recebido um transplante e que, na semana da caminhada, eu descobri que não tinha resistido. De algum modo, caminhar por 42 Km passou a ter muito mais sentido para mim.

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Shine Night Walk, o início.

E lá estávamos nós esperando a maratona começar. Algumas pessoas estavam beeem alegres. Muito alegres mesmo. Outras mais quietas. Algumas meio perdidas. Mas todos estavam, em teoria, prontos. E assim, por volta de 22:30, começamos a caminhar. A primeira milha foi tranquila. Quando chegamos ao primeiro pitstop (sim, tinha pitstop para salvar nossas vidas) já estava cansada e tentando buscar o motivo pelo qual eu aceitei fazer parte daquilo. Mais algumas milhas se passaram. O cansaço foi ficando imenso e nem aquelas ruas londrinas lindas me animavam.

Aí veio a chuva no meio da madrugada. E o frio. E o meu joelho começou o seu processo de se tornar similar a um balão (hello, tendinite). Em algum momento, no meio da madrugada, eu cogitei seriamente largar meus amigos ali e deitar em algum banquinho de uma praça qualquer. Mas resisti. Queria fazer aquilo pelo meu amigo, pela mãe dele, pelo Caio, pelo Edson… E aí eu comecei a pensar em outras coisas. Em como eu estava querendo desistir só porque estava cansada. Não que caminhar 42Km significasse resgatar alguma vida que se fora. Mas, simbolicamente, caminhar todo aquele percurso representava fazer algo por aqueles que, nem sempre, vão poder caminhar outro Km. E, então, eu parei de reclamar mentalmente e tentei focar em apenas continuar andando.

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Parte da Tower Bridge…Não, não tem foco…
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Vista da Tower Bridge…sim, continua sem foco…

E caminhando madrugada adentro, com frio e chuva, sem sentir mais os meus dedos do pé – que, por sinal, continuam roxos até hoje! – com meu joelho mega inchado, eu comecei a pensar nas outras milhares de pessoas que sofrem com o câncer. Fiquei olhando para todas aquelas pessoas que estavam caminhando com a gente e que carregavam o nome de suas “inspirações”. E fiquei pensando em quantas coisas nós podemos fazer para ajudar e não fazemos. A ideia principal da caminhada era de levantar fundos para pesquisas. E eu sei que nem sempre temos dinheiro para doar.  A vida é dura e a crise econômica está aí. Mas existem outras coisas que custam dinheiro algum. E, muitas vezes, a gente não faz nada porque estamos muito enrolados com nossas vidas. E, aí, nós nos esquecemos que poderia ser com a gente. E que seria bom se alguém tivesse um tempinho na agenda para doar sangue, um pouquinho de plaqueta. A gente fica pensando que se fosse com a gente, iríamos gostar de ter alguém que se dispusesse a ser doador de medula ou que seria legal se aquele fulano tivesse informado aos familiares que gostaria que seus órgãos fossem doados quando ele não precisasse mais deles. A gente fica pensando que, se fosse com a gente, iríamos gostar de receber uma visita no hospital, iríamos ficar felizes por saber que alguém fez algo pela gente. E, assim, vi o dia clarear…

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Ao fundo, Buckingham Palace. (Quase 11 horas de caminhada e vocês acharam mesmo que eu ia pensar no foco da imagem?)

Infelizmente, não consegui concluir os 42 Km. Meu joelho estava muito inchado, o que tornou impossível continuar a andar. Abandonei a maratona aos 37Km, depois de um pouco mais de 11 horas de caminhada, por volta das 9 e pouca da manhã, e, para mim, foi como ter chegado ao final (Só para constar – se eu estivesse no Rio de Janeiro, de acordo com o Google Maps, seria o mesmo que caminhar do centro de Bangu até a praia de Botafogo…só olhar no mapa). Mesmo não tendo ido até o Km 42, meu amigo, o mesmo que fez o convite, conseguiu uma medalha para mim e ela tem um valor muito especial.

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#ShineWalk

Mostra que, mesmo não podendo mais fazer nada pela mãe dele, ou pelo Caio ou pelo Edson, ou pelas crianças do hospital, eu ainda posso fazer algo para os que ainda precisam…seja doando dinheiro, sangue ou meu tempo. Não é preciso caminhar 42km todo dia para fazer a diferença. E, você? Qual vai ser sua maratona?

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Cartão super fofo que eu recebi da equipe da maratona… Aí vai uma tradução express…”Olá, Mariana. Sentimos muito por saber que você quase chegou à linha de chegada. Você é uma vencedora aos nossos olhos. Muito obrigada novamente. Esperamos que seu joelho melhore logo. Use sua medalha com orgulho!”